A Catalunha na memória histórica familiar (Continuação)

A Catalunha na Memória Histórica Familiar

II. Jerónimo de Mendoça Furtado e Albuquerque (1630-1692)
 Quando o nosso antepassado Jerónimo de Mendoça partiu de La Valette, depois de ter servido cerca de 6 anos na Ordem de Malta como Cavaleiro, os castelhanos preparavam-se para sitiar Barcelona. Considerando que esta situação de guerra se revestia de grande importância, não só pelas relações de amizade e auxílio existentes entre Portugal e a Catalunha desde a Restauração, mas também pelo facto de o esforço militar de Castela nessa província aliviar a pressão militar sobre Portugal, Jerónimo de Mendoça decidiu acompanhar de perto os acontecimentos. Assim, de Gerona, passou disfarçado à Catalunha e aí percorreu as principais posições estratégicas, inteirando-se de todos os aspectos militares e logísticos, com vista a organizar uma eventual operação de socorro, a partir de Portugal.
Refira-se, a este propósito, que a revolução na Catalunha havia começado em meados de 1640, com o confronto entre os cavaleiros da montanha catalã e os radicais da Corte de Filipe IV. Com efeito, a revolta dos camponeses e da nobreza, arruinada pela alta de preços, a resposta violenta das tropas reais e o desencadear, a partir do "Corpus de Sangre", em 7.VI.1640, do terrorismo contra a aristocracia e a alta burguesia, estiveram na génese da revolução. Este movimento, apoiava-se politicamente numa coligação formada pela "Generalidad", os cavaleiros da fronteira e o Cardeal Richilieu. O Conde-Duque de Olivares tentou subjugar os catalães pela força, o que provocou a adesão da maior parte dos hesitantes. Foi então proclamada uma efémera república independente, para algum tempo depois Luis XIII, Rei de França, se assumir como Conde de Barcelona. A Catalunha transformou-se, assim,  num campo de batalha entre a Espanha e a França. A guerra desenvolveu-se em torno da disputa das praças de Tarragona, a sul, Perpignan, a norte e Lerida, a oeste. Na primeira praça os catalães conseguiram resistir às investidas espanholas; Perpignan caiu em poder dos franceses (29.VIII.1642); e Lerida foi ocupada por Filipe IV (31.VII.1644)...
De toda esta situação era conhecedor Jerónimo de Mendoça, pelo que, regressado a Lisboa, se apressou a relatar a D. João IV o que presenciara, oferecendo-se para organizar uma operação de socorro. Não tinha ainda 20 anos e talvez por esse facto, a sua proposta não foi tida em devida consideração, tendo-lhe o Rei dito que " a sua idade parecia ainda verde para empenhos de tanta consequência..."
Frustradas as perspectivas de expandir o espírito de luta que, de resto, havia
 de estar presente em todas as situações da sua agitada vida, recolheu a Mourão, onde seu irmão Francisco era o Alcaide-Mor, na ausência do pai, Pedro de Mendoça Furtado, um dos líderes da Restauração de 1640 e, então, Guarda-Mor do Rei D. João IV.
Alguns anos depois, Jerónimo de Mendoça distinguir-se-ia nas guerras da restauração, sendo pelos seus feitos nomeado Governador e Capitão General de Pernambuco. Em 1673, haveria de ser acusado cúmplice de seu irmão Francisco, em virtude de não o ter denunciado como cabeça da conspiração organizada para repôr o Rei D. Afonso VI no trono de Portugal. Tendo Francisco de Mendoça fugido para Espanha, achando-se como Vice-Rei da India o seu outro irmão, Luis, Conde de Lavradio, recaiu sobre Jerónimo toda a ira do Regente D. Pedro, futuro Rei absoluto D. Pedro II, que o manteve preso durante 7 anos, confiscando-lhe os bens e impedindo-o de suceder a seu irmão Luis no título e no morgado da Quinta da Bacalhôa. Acabou os seus dias exilado na India.
Excertos do livro "Historia e Genealogia dos Mendoça Furtado, Alcaides-Mores de Mourão (1476.1674), 2001, de minha autoria, trabalho de investigação, em que tive a honra e o prazer de tentar reabilitar a memória deste nosso antepassado, tão maltratado pela História e pelos poderes e intrigas palacianas de um absolutismo em crescendo.

III. Luis Garcia de Bivar (1685-1760)
Vivia-se, então, uma época agitada. Filipe V, Rei de Espanha declarara guerra a Portugal, após D. Pedro II ter aderido à Quádrupla Aliança (Inglaterra, Holanda, Suécia e Dinamarca) contra a França, apoiando, assim, a pretensão do Arquiduque Carlos, futuro Imperador Carlos VI da Austria, à sucessão no trono de Espanha, em prejuizo de Filipe de Anjou (Filipe V, Rei de Espanha), neto e presuntivo herdeiro de Luis XIV de França. 
Luis Garcia de Bivar, depois de ter servido em diversas praças do Alentejo, como Arronches e Campo Maior e em Albuquerque, sob o comando do I Conde das Galveias e do III Conde de São Vicente, levantou à sua custa uma companhia de cavalos, assumindo o seu comando como capitão, tendo sido destacado para Campo Maior, onde se bateu em vários encontros com o inimigo. No início de 1706, a sua companhia foi incorporada no exército de D. António Luis de Sousa, II Marquês de Minas, que conseguira concentrar num só corpo todas as tropas aliadas, formando uma força de 30.000 homens, preparados para invadir Espanha. Este exército, entrando por Badajoz, queimou Brossas, tomou Alcântara e seguindo na sua marcha vitoriosa, conquistou Ciudad Rodrigo, onde o esquadrão de Bivar perdeu um soldado e 12 cavalos, Salamanca, onde o Arquiduque Carlos foi aclamado como Carlos III, Rei de Espanha, Cória, Placência, Moreleja, etc. Entretanto, D. Pedro de Noronha, II Conde de Vila Verde e futuro I Marquês de Angeja, partiu para Madrid para tomar posse da cidade, em nome de Carlos III. Segóvia, Toledo, Ávila e Talavera renderam-se. Finalmente, em 28 de Junho de 1706, o Marquês de Minas entra vitorioso em Madrid.
Luis Garcia de Bivar, cujo desempenho em combate e desembaraço em missões de alto risco e secretismo, haviam suscitado a atenção e consideração de Marquês de Minas, foi por este enviado de Madrid à Catalunha, com missiva ao General Charles Mordaunt, Conde de Peterborough, comandante do exército dessa província, para que se lhe reunisse, o mais rápidamente possível, em Madrid, a fim de reforçar e consolidar a ocupação da capital, o que, como é sabido, não ocorreu em tempo, fazendo gorar o sucesso da conquista da capital e, consequentemente, inverter o rumo da campanha.
Luis Garcia de Bivar, continuou a parcipar activamente em todas as acções militares de importância, distinguindo-se pelo seu valor e abnegação, até à celebração do tratado de Paz de Utrecht, em 11 de Abril de 1712. Regressado à Corte, foi nomeado Ajudante de Ordens do Mestre de Campo General, D. Nuno Álvares Pereira de Melo, I Duque de Cadaval, depois com as mesmas funções junto do Governador das Armas da Corte e da Estremadura, D. Diogo de Noronha, III Marquês de Marialva, tendo sido promovido a Coronel, exercendo também as funções que hoje corresponderiam a Inspector ou Director da Arma de Cavalaria. Manteve-se como braço direito do Marquês de Marialva até ser nomeado, no posto de General de Batalha, como Governador da Nova Colónia do Sacramento e Terras Confinantes do Uruguay, onde faleceu. Casou com sua prima co-irmã, D. Ana Josefa de Bivar Albuquerque de Mendoça, trineta e representante de Jerónimo de Mendoça Furtado e Albuquerque, mencionado no parágrafo II.

Serra de São Mamede, Alto Alentejo, 3 de Outubro de 2017

Luis Bivar de Azevedo
 
 


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